Olho D'água do Borges/RN -

A conta que não fecha: o subfinanciamento da saúde pública e o preço da omissão

 

É dramático o quadro do sistema público de saúde do Rio Grande do Norte. Quase que diariamente, a imprensa mostra os problemas, que parecem crônicos: falta de insumos, quebra de equipamentos e atraso em repasses para profissionais de saúde e outros fornecedores. Em que pese o valoroso trabalho dos servidores, a população potiguar teme adoecer e precisar ir a uma unidade de saúde. Pode não conseguir assistência.

O diagnóstico é incontestável: o sistema está subfinanciado. Em outras palavras, falta dinheiro para manter a estrutura. A crise da saúde potiguar não decorre apenas de má gestão ou de ineficiências pontuais — embora também existam —, mas de uma equação estrutural na qual a demanda cresce exponencialmente enquanto o orçamento permanece artificialmente comprimido.

A conta que não fecha: o subfinanciamento da saúde pública e o preço da omissão - Foto: José Aldenir/Agora RN

Hoje, apenas 12,5% da receita do Estado é destinada à saúde. O próprio secretário da pasta, Alexandre Motta, já admitiu publicamente que o mínimo necessário seria 14,5%. Além de o dinheiro ser pouco, ainda tem a frequente judicialização de procedimentos, que abocanha uma boa fatia do orçamento – por ano, algo em torno de R$ 360 milhões (cerca de 15% do total da área).

A diferença entre o que se investe e o que deveria ser investido não é uma porcentagem fria em planilha: é a distância entre a vida e a morte.

O Hospital Walfredo Gurgel, maior unidade de urgência do Estado, opera com um tomógrafo de 15 anos de uso, quebrando constantemente e interrompendo diagnósticos vitais. Pacientes aguardam cirurgias por meses. Faltam insumos básicos muitas vezes em hospitais. Semanas atrás, o governo precisou recorrer a empréstimo de produtos na Paraíba para reativar leitos de UTIs que estavam fechados. Nada disso é novidade — é rotina. E rotina em saúde pública significa sofrimento institucionalizado.

Os fatores que explicam essa asfixia são conhecidos: procedimentos cada vez mais caros, avanço tecnológico sem correspondente atualização orçamentária, repasses federais congelados há anos e municípios que descumprem suas obrigações, empurrando despesas para o Estado – que, por sua vez, também não consegue dar conta do recado. O resultado é uma rede estrangulada, funcionando no limite, com servidores sobrecarregados e população desassistida.

Isso sem falar na epidemia de acidentes de trânsito – que resultam, na maioria das vezes, em motocicletas com traumas ortopédicos. A estatística já virou até jingle em peça de propaganda: a cada hora, um deles dá entrada no Walfredo. Também têm aumentado os casos de AVC, infarto e câncer, e por aí vai…

Não faltam diagnósticos. Falta decisão. Enquanto o Estado se vê preso a uma estrutura orçamentária engessada e ao peso crescente da folha de pessoal — como discutido no editorial de ontem —, a saúde pública é tratada como variável de ajuste. O que deveria ser prioridade tem sido tratado como despesa contornável.

É preciso coragem para mudar esse cenário. O Governo tem duas saídas concretas: ou recompõe o orçamento da saúde retirando recursos de outras áreas — o que exigiria enfrentamento político — ou cria novas fontes de receita específicas para o setor. Em outros locais, o caminho foi destinar à saúde parte da arrecadação de loterias, concessões e outras operações econômicas. Países e estados que fizeram reformas sustentáveis da saúde só avançaram após atrelar receitas vinculadas a serviços essenciais.

Adiar a solução significa aprofundar a crise. Saúde não pode ser financiada com sobras nem depender de emendas parlamentares ou favores de Brasília. É dever constitucional, moral e civilizatório. O Rio Grande do Norte já vive um colapso fiscal; permitir um colapso sanitário simultaneamente é condenar a população à barbárie institucional.

O RN precisa escolher se continuará só gastando com o passado, como hoje ocorre com a Previdência inchada, e a folha de pessoal, ou se terá coragem de investir no presente, salvando vidas e garantindo dignidade. Ajustar a máquina pública deixou de ser uma opção — tornou-se uma condição de sobrevivência. E, nesta equação, a saúde deve estar no topo das prioridades. Porque não existe justiça social nem desenvolvimento econômico em um Estado que não consegue garantir o básico: o direito de viver.

 AgoraRN 

0 comentários:

Postar um comentário

 
Copyright © 2010-2013 Blog do Gilberto Dias | Todos os direitos reservados.
Desenvolvimento » RONNYdesing | ronnykliver@live.com - (84)9666-7179